To be Lu

Lu,

eu vou te falar da minha vida, sobre o que está acontecendo, o que estou fazendo e pensando ultimamente. Ainda sinto saudades da minha antiga rotina, da política e da convivência divertida com o meu povo. Na verdade, essa saudade tem crescido com o tempo – você sabe que eu nunca saí da fase do porquê – e quis saber o porquê disso.

Não faltaram explicações, a mais simples: foram muitos anos de dedicação, minha juventude deixa saudades. Outro fator: foi a obra da minha fé no mundo, naquele tempo realizei o que sonhei. Mais uma: nesse caminhar, houve muita dor, prazer e aprendizado, muito do que sou hoje se deve a essa época. Mas a explicação mais provável é que com o tempo passando estão sobrando apenas boas lembranças.

Lu, fiquei pensando em você naquele tempo. Você é tão importante na minha história – sei que, às vezes, sou Exagerado, ou quase sempre, mas quero que receba isso como uma simples verdade: você, Lu, é a pessoa que eu mais absurdamente amo de todo universo e além; é muitas vezes a pessoa responsável por eu responder TO BE, quando estou nos meus momentos OR NOT TO BE. Eu te amo muito.

Agora, escrevo em qualquer lugar, ainda é manhã, estou sacolejando rumo a Maricá, a mochila no colo sustenta o bloquinho que ganhei na Conferência de Saúde Ambiental, o mp4 selando os ouvidos canta Zeca Pagodinho “ô pretinha fiquei amarrado na sua cozinha”, bloco e lápis sincronizados com as ondulações da estrada, temos uma hora daqui até lá. E hoje você é minha acompanhante.

Vou e volto todos os dias, inclusive sábados e, às vezes, domingos. Cada viagem é 1 hora; ida e volta = 2 horas, somando as esperas no ponto e as caminhadas mais 1 hora. Isto é, 3 horas por dia somente exercendo meu direito constitucional de ir e vir. E pago caro para isso, mesmo não sendo fruto do meu desejo. Mas, pasme, eu gosto.

Descanso e reflito nessas horas do caminho, afinal não me sobram muitas opções, embora também, escute música, fale com desconhecidos, escreva... Na volta, acabo dormindo, ou meditando, não sei bem a diferença entre as duas coisas e acabo parando no Terminal, no Centro de Niterói, é quando penso: __ Aff!

Chego meia-noite em casa, vou dormir às 2h da manhã, acordo às 7h. Dormir cinco horas por dia é pouco. Durmo também no fim da tarde de sábado até a noite, e durmo domingo à tarde até o início da noite. Amo dormir, tenho dois mundos, meu corpo sutil - que vivia voando - tem poucas horas de uso ultimamente. Se realmente for morar em Maricá, isso vai entrar em um bom equilíbrio. Vou voltar a ter minha duas vidas, enquanto isso sigo sonhando acordado.

Acordar cedo e dormir tarde virou mania que, aturde-se, eu gosto. Há meses vejo manhã, tarde, noite e madruga: um dia inteirinho. Amo cada fase do dia, tudo vai mudando de forma sutil, a temperatura vai oscilando, a luz transforma as coisas, mesmo que fique parado, vários lugares vão passando por mim, com seus sons, mil orquestras desfilam no meu dia, gostamos do maestro Silêncio, lembra? Até o humor dos personagens que povoam meu dia muda, hoje o motorista estava revoltado porque o genro quer ganhar o terreno da família para casar com a filhinha dele, “já estou dando a minha filha, tenho que dar o terreno?! Ele que trabalhe!”. É o dote, avisei, tem que pagar o dote. Meu dia é um filme.

Quer ser minha roteirista? Ou diretora de arte? Remake me!

Para o motorista, legislei em causa própria. É verdade. Adoraria ser dessas famílias onde ganha-se carro ao passar no vestibular e casa ao casar. Não estou reclamando, minha família me deu muito mais do que isso, principalmente alegria, foi em casa que aprendi a sorrir.

Às vezes, a caminho do ponto de ônibus, vou gradualmente me distraindo a olhar as copas das árvores, os desenhos que as suas raízes provocam na calçada, vou me distraindo com os olhares apagados que seguem para dentro de si. Sei que o desligado sou eu, mas quem passa por mim com mim com olhos mirados para frente, na verdade, carrega diante de si um espelho, está se encarando o tempo todo, certamente fixado em seus próprios dilemas. Já tentou andar olhando fixamente para frente? Não dá para ver nada, é somente um horizonte distante.

Vou carregando tudo do caminho, nuvem, lua, cachorro, criança, poste, árvore, encosta, muro, calçada, casa, carro... Noto as mudanças que vão ocorrendo no cenário da minha vizinhança. Vou me transformando em paisagem. E quando vejo passei do ponto de ônibus.

Lu, quero tanto sua companhia que reaprendi a pensar bem forte, e penso em você, e sei que pensa de volta em mim. Agora, enquanto estou escrevendo e enquanto está lendo essa carta, você pensa ‘parece que já li’, ou “roubou minhas ideias”, ambas verdades. Estamos juntos em um safari literário caçando estas palavras e emoldurando-as na parede de papel, nossa galeria de arte. Minha curadora é você. Anos a fio capturando suas qualidades em palavras e ainda encontro novos elogios; isso se ‘minha curadora’ for elogio.

Ultimamente tenho reparado nas minhas reincidências, repetições, mesmices, manias, ecos. Essas coisas que fazemos uma vez e repetimos por anos, depois pela convivência com elas resolvemos dar nomes a cada uma, é Gosto, é Fé, é Vício, é Meu Jeito, é Simpatia e até é Personalidade. Se uma pessoa normalmente tem 10 mil manias, tenho 1 milhão. E continuamente busco novas, gosto de assumir as manias das outras pessoas. Acho que acabei de ceder à antiga mania de sair do assunto.

Tenho reparado mais nos meus erros que se repetem – era sobre isso o parágrafo acima:
esquecer de todas as datas, viver sem relógio, me alimentar precariamente, adiar todo adiável, inventar desculpas pelo's outros, humor intermitente, tentar colocar um dia inteiro em uma hora, buscar a solidão e sumir dos meus amigos... Quando ao enumerar esses defeitos, me lembrei de muitos outros e censurei, lembrei também daqueles que foram transformados em virtude, que lutei para mudar e mudei. Desta lista escolhi um bom combate: ser um amigo melhor para você e para o Renato.

Vocês merecem mais atenção, mais cuidado, mais carinho, mais eu... Quem mais vai ganhar com isso sou eu, sofro com a distância. Sinto falta dos dois nos meus dias. Amo existir e estar por aqui [na terra] com vocês; “com vocês” é a parte importante. Sem vocês meus dias são assim:
durante os dias da semana, manhã e tarde, eu fico dentro da Secretaria do Ambiente de Maricá, pesquiso, leio e escrevo diversas coisas na área de meio ambiente, desenvolvo instrumentos legais, programas e projetos, só saio para fazer lanche. Agora que minha sala é do lado da cozinha, não saio para nada, quer dizer só quando tenho alguma reunião.

Quando vou embora mal consigo focar as coisas, de tantas horas que passei lendo no computador, isso deve fazer mal. A execução anda a passos de serviço público e, até essa semana, estava sozinho na minha equipe. Ainda por cima, às vezes, meu lado criativo falta reunião, noutras meu lado animado tinha ido viajar, é difícil reunir-me todos para resolver um problema. Definitivamente preciso de mais gente na minha equipe para produzir bem, “eus” não bastam.

Quase sempre fico até mais tarde na secretaria, aproveito a calma do lugar para estudar alguma coisa que precisa de mais atenção. Ou quando saio do trabalho na hora certa, vou para academia. Sim, eu vou para academia de ginástica; a Flávia que é a dona do estabelecimento Vip Academia, fica batendo papo comigo, enquanto sofro, ela ainda diz para eu colocar mais peso e cortar o cabelo, respondo a ela que quero continuar magro e que meu cabelo é rebelde assim mesmo, digo “não parece, mas ele é bonito”. Ela ri, as outras meninas também riem, uma delas, que eu chamo de Humilhação, coloca 30 vezes mais peso do que eu.

Meu corpo não mudou quase nada esteticamente, mas sinto mais disposição, me canso menos, penso melhor, me concentro mais na faculdade, vivo sem estresse, além de ser legal ir para academia. Realmente estou gostando.

Aos sábados estudo de manhã em Maricá e a tarde inglês em Niterói. Vou bem no curso de inglês, minha média é quase 10, fico todo bobo comigo mesmo por conseguir ser disciplinado. É claro que chego na faculdade e sou surpreendido com algum trabalho para entregar, marcado há séculos que todos sabem menos eu, estudo para prova da disciplina errada, no meio do período ainda não sei que aula é hoje e implico com os professores, eles riem, gosto muito de todos na minha turma. Eu poderia ser um bom aluno, se pudesse ser outra pessoa. Mesmo assim estou aprendendo bem.

Estou falando aqui sobre qualquer coisa, são detalhes da minha vida. E deixando de fora um fato muito importante, porque quero falar pessoalmente. O que quis dizer aqui, já disse: te amo, quero mais você.

Quero te contar mais, ou já está cansada?

Minha vida está melhor do que nunca, só perdendo para minha infância. Estou produzindo muitos textos esse ano. Vi que escreveu sobre meu Hable Com Ella: “Ah, e esses aqui ficaram de fora, de castigo, porque os Safados escrevem muito raramente”. Magoei, mas sem dúvida tem razão. Então, como uma meta de boa amizade, vou passar a ser um assíduo escritor para te dar mais um elogio: minha destinatária. Diga comigo, yes, Ti can.

Estou conversando com você sem roteiro, olha o assunto que acaba de entrar do nada:
Maricá é uma paz e uma alegria. Niterói é uma saudade, mas perdi o desejo de voltar a vida passada, ganhei novos problemas para resolver. Existe uma ansiedade em mim, gostaria de ver os resultados daquilo que estou construindo agora, aqui minha saudade ajuda, porque me lembro das batalhas vencidas, dos feitos, das derrotas e das voltas por cima (ou por baixo mesmo, na base da rasteira), isso me acalma e permite que aproveite os prazeres que encontro no caminho. No fundo sei que a vida não presta (ou é muito pior), mas sou um privilegiado de fazer parte do lado bom de viver:

aqui desse lado vejo você, Lu, cavalgando um leão, o Renato é um gigante devorando a Europa e as cores me obedecem. Que Deus resistirá ao nosso paraíso? Que Deus é esse que adora ouvir nossas conversas? Deus quer ficar entre nós. Quando triste, Ele vem se animar com nossa alegria, nossas criações, bobagens, poemas, amores, diálogos imaginários, ou só de estar juntinho. Deus quer brincar com a gente. Vamos brincar de almas gêmeas?

Com amor,

Seu exagerado
Seu.

PS.: Oi, tudo bem com você?

2 comentários:

Anônimo disse...

Lu, fiquei pensando em você naquele tempo. Você é tão importante na minha história – sei que, às vezes, sou Exagerado, ou quase sempre, mas quero que receba isso como uma simples verdade: você, Lu, é a pessoa que eu mais absurdamente amo de todo universo e além; é muitas vezes a pessoa responsável por eu responder TO BE, quando estou nos meus momentos OR NOT TO BE. Eu te amo muito. GOSTEI DESSA PARTE. BUT IM STILL THINKING............ ESTA PARTE ME FEZ LEMBRAR, D UM AMOR DO PASSADO, QUANDO ELE TINHA SOMENTE 15 ANOS E TALVEZ TINHA UMA MESMA INICIAL. ADOREI..... BJS LU

Lu Morena disse...

Você,
definitivamente,
é o meu maior elogio.

Sempre.