Sem Verbo

I-
Um sonho bom a semana inteira.
Durante toda a semana
o mesmo sonho de domingo a sábado,
no início: entre beijos, pela boca entreaberta, carícias a contra pêlo e
palavras adstringentes (por fim).
E tudo de novo, todos os dias, ou melhor, todas as noites,
todas as madrugadas, esses dias negros!


Depois disso,
já de olhos despertos,
saudade, por todos lugares
(De todos lares
aos copos dos bares).

Na verdade, muita saudade,
um pouco de lamento e um tempo de solidão.
Nesse tempo, por baixo dos panos, em segredo, minha angústia,
por cima deles: meu romantismo duvidoso com textos sem verbos,
sem esperança,

sem força para nada,
somente para os passos.
Passo após passo,
meus pés independentes de mim,
minha vida sobre o peito do pé,
pé ante pé,
pelo seu caminho,
desse caminho à corda bamba,
com felicidade falsa de um lado,
conformismo verdadeiro de outro,
passo após passo,
equilíbrio após susto,
até que um passo em falso...
Poft! na calçada.

Último delírio,
num dia muito esquisito
feito de hoje.






II -
Hoje, você e eu juntos de novo,
dessa vez fora do sonho,
aqui dentro, num passo em falso de morte...
Morte: com olhos tristes, atônitos, até o chão,
além dele, pelos seus sete palmos.

Sonho e realidade, tudo muito confuso, confusão com sabor de saliva.
A saliva das suas palavras desnecessárias, seu aviso, suas certezas equivocadas:
“Hoje e nunca mais”... (de novo!?)

Do seu último “nunca” até agora: uma semaninha.
mesmo num Nunca breve assim, que ruim!
Seu nunca, tempo demais para minha vida curta,

mais breve vida.
Nunca, pela metade! pelo menos.


Pois metade do seu nunca, numa matemática apressada, igual a 3 (três) dias [e meio]!!!


Nesse meio nunca, só beijos, palavras e abraços,
bocas, cansaços e juras, uma felicidade só.
Felicidade em meio ao nunca...


Uma vida generosa, sem nuncas,
como no sonho:

7 vezes: de domingo a sábado.
Assim, saudade, lamento e solidão: nunca mais!
Na verdade, um pouquinho de saudade, talvez.
(e um ‘nunca mais’ de fato, não o seu nunca mais)

Na realidade,
porém, na nossa cadeia:

Depois do nunca, os dias.
Depois de dias, a noite.
Durante a noite, o sonho.
Depois do sonho, a saudade.
Durante a saudade, a espera.
Depois da espera, a bonança.
Durante a bonança, os beijos (e que beijos!).
Depois dos beijos, a tempestade.
Durante a tempestade, o “nunca mais”.
Depois do nunca, mais espera...
Até quando?

Até quando: Hiatos,
(de quando em quando, mas sempre desnecessários)
entre um sujeito sem verbos
e um triste predicado sem jeito.
Hiato da promessa em sonhos às madrugadas do nunca.

Sonho bandido

Ver-te assim, sereno
me rouba o sono
e me vingo:
assopro no ouvido uma jura
que arrepia teu sonho bandido.

Abrem-se os olhos,
que me deixam nua.

No silêncio do despertador,
acerto minha respiração com a tua
como quem dá corda no relógio da vida,

na primeira manhã da despedida...

Causa Mortis

Agora,

vou esconder minha tristeza,
para não ser egoísta,

e dar alegria, na mesa do bar,
p'ros meus amigos tristes...

Na rua,
tapo meus ouvidos com música,


para calar essa dor
que me mói os ossos

pouco a pouco


e mais um tanto...



até ranger!


Mas em casa, não ligo a tevê,
e deixo enfim me abater,
meu desalento incurável...

Só para gostar de estar vivo,
nessa última noite sem fim.

longe assim: . . .


Você reparte-nos...
Vai
embora.
(para longe assim:>>>>>>>>. . .)

E seus passos vão
>>>>>>>>>>>>caindo

>>>>na calçada

>>>>>>>>>>>>como folhas

>>>>de um outono

>>>>>>>>>>>>severo . . .

Minhas mãos de adeus voam . . .
Como pássaros migratórios,

Vou seguir seus rastros vãos;
essas memórias caídas,
feito migalhas de pão.

>>sei que você
>>>>>>>>>>vai e
>>>>>>>>>>>>volta,
>>>>>>>>>>>>vai
>>>>>>>>>> voar
>>>>>>>>o vôo
>>>>em vão . . .

Pousa, no precipício do mundo,
onde mil olhares deságuam
feito reticências,
num poema triste . . .

Vestígios

Rabisco idéias em mil fragmentos
de papel, junto agulha, linha e borracha
pra cozer uma estranha colcha de retalhos...
Cubro-me dessas teorias entrelaçadas,
(frutos do ócio, do tédio, das coisas que andei usando)
e durmo. Sonho com meu livro de fogo e sombras,
acordo-me em cinzas

de mim, sobram apenas
vestígios de um livro fantástico.
Sou esses textos mutilados.

Mas
passou por mim um Poema pronto (com trilha sonora e tudo)
e não parou...
Meu pulso, sim.




(ou melhor, quase).


E você desaparece,
(enquanto ainda decido se corro atrás ou faço Psiu!)
minhas horas se consomem em sua espera,

no ônibus, na UFF, no corredor, na praça,
na rua, no prédio, naquela festa, na van...

__ Passa aqui quando voltar de sei lá.
Meu Poema desconhecido,
vai por aí, desenhando palavras aladas,
com seus passos que transbordam dorremis.