nova Arte

Já falamos tanto de amor,
criamos desejos,
saudades
matamos, morremos de felicidade.

Descobrimos tanto de mim em ti,
que me deixa nua cada palavra que despe de mim.

Tudo é nosso assunto, Deus, vida, família, amigos...
O universo nos diz respeito.
Já fizemos mágica juntos,
 emprestamos beleza ao mundo
  e alegria aos amigos.

E passou apenas um grão de areia na ampulheta do nosso tempo,
vecemos o adverso e

nos tornamos Paisagem.

Mas o que somos?
 Um conto?
  Uma fábula?
   Um romance?
    Uma pintura?
     Um filme?
      Uma partitura?
       Um circo?
        Uma escultura?

Há uma nova Arte nascendo em nós…

Simples de coração

Já pensou, se um dia, de supetão, acordamos?


Você desorientada,
sem saber se é manhã ou madrugada,
se pode dormir mais ou se está terrivelmente atrasada,
espera um pouco...
Começa a ouvir os sonzinhos da manhã e
pensa em mim.

Parece que sonhou, mas não consegue se lembrar bem com o quê,
será que foi bom, foi por isso que acordei?
Como é que começamos com esse romance?
Eu tenho que trabalhar hoje?
Cadê ele?

Achei que estivéssemos dormindo juntos,
será que ele foi embora ridicularmente cedo...

Tenta recordar capítulo a capítulo, nossas cenas espalhadas na memória,
totalmente mágicas para nós e completamente banais para o resto do mundo,

assim nos amamos, como quem guarda um tesouro, um segredo, a chave de um reino encantado.

Aqui estão aquele gibi, ah olhares, um deus, o éden, hum praia, hmmm lagoa de araçatiba, o apocalipse... Acaba adormecendo com a mão no ventre...


Acorda de novo, o sol já aquece as plantinhas da janela, como elas crescem rápido.
Ai, meu santo, já é dia. Estou definitivamente, absurdamente, desempregadamente atrasada!!!

A não ser que seja sábado...

Hum que saudade...
Para com isso! O quê que é isso? Eu tenho outras coisas a pensar...
Só não consigo me lembrar o quê.

Ela cobre os olhos com um turbilhão quem vem de sabe lá: tudo lindo e bruto.
Meu deus, morri!

Resolve deixar um recadinho para ele na internet. Mas que estranho, não tem nenhum recado dele, procura entre seus contatos, mas não está lá. Pensa: estranho, por quê que ele se excluiria de mim assim?

Elabora um recado mau criado, resolve mandar pelo messenger, mas ele também não consta na lista de contatos. Aaaaarght!

O quê será que está acontecendo? Ou pior, que aconteceu? Que fiz? Pode ser que ele esteja chateado comigo. Ou talvez ele seja alérgico ao amor, raríssimo, mas uma explicação perfeitamente plausível:
_ Durante a noite se sentiu intoxicado com esse hálito perfumado que os amantes têm, e espirrou tão forte que explodiu em um milhão de partículas. Agora, porque acabei inalando uma parte importante dele, está internado no hospital, em observação, semiconsciente, querendo me amar, mas proibido. Bem... talvez, não.

Ela procura refazer seus passos, começa a se lembrar daquilo que fez; o que fizemos juntos; não é possível, não há nenhuma explicação melhor do que a pior explicação de todos os tempos. Tem um pressentimento de que algo muito errado está acontecendo. E até o seu humor começa a ressecar.

Lembra-se das fotos, palavra por palavra dos bilhetinhos que ele costumava esconder

“cheirinho de entardecer,
a janela um silêncio.
À espera, tudo calminho...
De súbito arrastam continentes,
transtornam qualquer caminho,
sufocam o dia seguinte com a memória dos corpos profetas”.
Que aperto, meu coração está pequenininho. Oooh.

Sem querer pensar em mais nada, lembra do primeiro bilhetinho, improvisado num pedaço de papel que ganhou pela janela do ônibus, “para rir, peixinhos beliscando pés”, “traga-me o apocalipse...”
Poemas do primeiro encontro. E esquece-se do resto,
vai pegar a carteira, onde o guardou e nunca mais tirou, procura o papel dobrado, “bilhete rasgado” era o nome, sorri por ter lembrado de mais um pedacinho; continua fuxicando repetidamente os compartimentos da carteira, mas onde está?!
Sem mais paciência, tira tudo da carteira, e nada, nem aqui, nem acolá!

Aquela sensação de que tem-alguma-coisa-errada sobe pela espinha como uma escuridão, parece que seus fantasmas estão de volta.

Procura pelas pessoas em casa para acusar, se alguém mexeu na carteira, mas ninguém sabe de qual bilhete está falando... Óbvio. É inútil. Qualquer coisa serve a essa altura, lembra-se então: as fotos, claro!

Volta ao computador, mas a pasta 19/12 não está lá.

Abre o email, não há nada lá também. Nada. Por que ele tem essa mania idiota de não ter celular? O cara velho é cheio de manias esquisitas.

Mil explicações absurdas começam a tomar conta do seu dia, será que Deus resolveu brincar com coisa séria; será que alguém fez isso; será que me drogaram? Ou, pronto, ele conseguiu, enlouqueci! Agora, só me sobrou esperar a Noite.

Eu vou na galeria, onde ele costuma passar após o trabalho, vai ter que me dar uma boa explicação.

Ah, quanta saudade... Tanta espera, com o saco cheio de teorias...

Chega mais cedo na galeria, olha em volta esquadrinhando o espaço, como se fosse o próprio deus desenhando aquela paisagem pela primeira vez.
Belo lugar: artes plásticas, net.café, jardim, gourmet, música, bar, mas nada, a paisagem está incompleta. Olha os banheiros, nada, vai no café, claro que nada, aproveita para checar mais uma vez a internet, facebook, email, fuxica tudo, não acha nada, como se simplesmente não houvesse nada a ser achado, se perde no tempo e sem sinal dele.

Quando vê a hora, a aula já deve ter começado! Corre para a faculdade, está todo mundo, menos quem procura. Senta-se entre as amigas, pergunta a elas, mas elas não sabem quem esse tal fulano.

Ela conta a história, elas riem, não entendem nada, acham que está inventando tudo, ela se irrita, as amigas dizem que não tem nenhum fulano na turma, que hoje é o último dia de aula.

Definitivamente louca. Definitivamente sozinha nesse mundinho.

Ela se lembra de tudo, mas não aconteceu. Como pôde? Nunca existiu palavra alguma? Nem mãos e nem um amor bruto... E a vida, lembra? Começa a voltar a si, é mesma de sempre, nada mudou.

Tem uma incômoda saudade, vai se lembrando de suas preocupações reais, com Deus, com o trabalho, com a desculpa que vai inventar amanhã... Que peninha.


De repente, pi-pi-pi-pi-pi, pi-pi-pi-pi-pi, acorda,

ufa! Foi um sonho, desliga o irritante despertador, abre o calendário do celular,

mas ainda é dia 19 de dezembro de novo.

Levanta-se, então, meio confusa, lava o rosto, liga a cafeteira e começa a refazer quem é.



Não se lembra do rosto que buscou, os fragmentos do sonho vão se dissipando, quanto mais busca mais se distancia e fica fria. Até sobrar na boca somente um gosto de sombra.

Segue o dia normalzinho até esquecer tudo. À noite entra na sala, tenta se lembrar do sonho para contar para as meninas e não consegue, deixa para lá...

Então, não existe, nada disso aconteceu; sua vida tem o mesmo agosto.

Volta para casa com vontade de dormir mais, de preferência sonhar.

Na manhã seguinte, desperta tranquila sem resquícios, agradece a Deus por tudo, mas-porém-todavia nenhum sonho estranho, nenhuma brutalidade, vai a vida indiferente dia após dia.

Mas seu corpo está inconformável, ao sair na rua, os olhos buscam o intangível.



Vivo mais um dia no esquecimento.



Então vem a noite, a infalível atmosfera dos amantes.



Entro na locadora. Lá você está, com esses olhos de comer destinos, conversando com o dono do lugar sobre qual filme que vai levar.

Seu corpo me reconhece, mas você, friorenta e inane, não acredita em magia, ainda.

Eu logo lhe reconheço,
já abençoado com o dom de capturar o inefável. E digo a mim mesmo, paciência, paciência:
melhor começar com uma provocação.



_ Lembro que o nosso primeiro encontro começou por acaso, em um lugar como esse.

_ Eu estava na locadora querendo muito ver aquele filme que de tão lindo fica deprimente assistir sozinha.

_ É, você estava falando isso pro dono da locadora.

_ Aí, você se meteu na conversa, como se fosse íntimo.

_ Ou predestinado

_ Predestinado a irritar. Por que você se infiltrou na minha vida?

_ Ah, porque prefiro filmes a dois aos filmes deprimentes.

_ ou porque você não resiste a donzelas indefesas.

_ ou porque converso com fadas, crio dragões e sei voar.

_ ou porque a vida é curta demais pra caber descrença.

_ ou porque eu me amo mais quando amo você.

_ ou porque você é carente e está sempre roubando ilusões.

_ ou porque as ilusões são meninas abandonadas nos becos escuros, cheia de medos bobos

_ que só precisam da sua mão, abraço e tudo bem.

_ ou porque preciso do seu tudo-bem, ventre e sorriso.

_ ou porque somos personagens desse filme a dois.

_ porque eu também sonhei com você.

Natureza Morta

Com o tempo, após ver tantas paisagens, pensei que fosse enjoar da estrada, parar na próxima cidade, construir um chalé com janelas voltadas pro mar e esperar até você me encontrar.

Mas você nunca veio, não moro no chalé, não conheci a próxima cidade e não caminho mais pela estrada,

mas ainda busco uma nova paisagem.

Agora já estou velho, fico feliz simplesmente porque sigo sem carregar raivas e rancores, por não sentir desesperanças e não ser descrente.

Ainda torço por todo mistério, pela mágica e bato palmas bem alto e forte para salvar as fadinhas, que vivem me amando com doces e cantigas.

Carrego apenas aquela satisfação desconhecida e uma única certeza: a morte. Sei o dia em que vou morrer.

E esse dia é hoje.

A morte sempre me deu vastos motivos para sonhar, em quê gostaria de me eternizar?

Na letra ferida, na memória da cidade, num óleo sobre tela, na tela do cinema, no seu olhar, na voz da soprano, nas memórias de caixa de sapato, na pele tatuada... Onde gostaria de me eternizar?

Hoje, isso não me interessa mais, que me esqueçam!

Acabo de lembrar-me de que não acredito na morte (não era isso que eu dizia quando julgava estar longe dela?). Não fiz nada para ser eterno, e não é hoje que farei. Fiz coisas feitas de sonhos, para divertir o tempo, matar saudades, fiz amor desmedido, tudo que é efêmero e belo.

Nada me resta, somente preparar a alma que está prestes a nascer no lado eterno da vida.

Mesmo aqui, no fim, tenho vontade de confessar que penso em você o tempo todo. Sempre pensei. Sinto sua falta como se tivéssemos passado a vida inteira juntos e eu acabasse de voltar do seu enterro para dormir na nossa cama, pela primeira vez, sozinho.

Exalamos flores, temperos, frutas, terra molhada, madeiras, lençóis amarrotados, suor e sabonete; será que no fim das contas seremos apenas o cheiro do pó e de tristes flores secas no cemitério?

A bem da verdade, é exatamente isso que me aconteceu, por mais que role, bata na cama e grite o horror, não consigo me livrar da sensação de que todos os dias dormirei com esse gostinho de morte.

1. INT. Quarto de menina. Noite.

O quarto está apenas iluminado pela tela do computador. Ela fica checando se alguém deixou uma mensagem nova na internet, senta na beirada da cama, olha uma págima, olha outra, depois outra e nada. Pelo visto, hoje todos foram dormir mais cedo. E como se não tivesse nada para fazer, começa a pensar em quem ela é.

ELA
(Escrevendo)
eu sou aquilo que chamam de felicidade,
uma felicidade incompreendida,
que até chora, raramente, mas chora.
talvez melhor: sou o amor
irrecusável, intenso, imenso, imoral,
que não pede para ser um só, ou dois,
ou que não pode caber na sua explicação.
não sou aquilo que você entende
ou que seja capaz de musicar.
eu te faço desafinar,
habito na sua dúvida,
na pulga atrás da orelha.
não sei o certo ou o errado, só
o que quero, e como quero, e o quanto quero, e onde quero, e quero mais. mais!
sou aquela ardência,
seu desejo bandido.
sou o medo da morte, a vida bem vivida, a ferida mal curada,
aquilo que vai ficar, mesmo quando nada estiver mais aqui.
sou o palco, tablado, refletor, a estréia,
devoro aplausos, olhares
voo para tela de cinema, sou seu filme predileto.
sou o muito prazer ao conhecer, aquela música bonitinha que cantei para você,
aquelas noites, aqueles dias,
aquela despedida,
que sonha em voltar.
eu sou aquela
que ainda vai te ensinar a voar.

Belezapura

_ Sempre que me lembro de você, te vejo cantando.

_ Você sempre me disse que onde há música não há maldade.

_ E não há, vamos fazer a nossa bondade

_ Aquela bondade cheia de más intenções?

_ É.

_ Vamos! Vem, vamos fazer a nossa festa.

_ Eu vou, a festa vai ser boa?

_ Vai sim... Digamos que os deuses gregos estarão presentes.

_ Assim, a vida é muita.

_ Você me chamou de Vida?

_ Hum hum, Chamei, eu disse: Vida, é muita (festa).

_ Então, a festa já começou.

_ Agora, você tem que aprender o caminho da minha casa.

_ Por qual caminho você se perde?

_ Pelo caminho que é do ladinho do seu.

_ Entre praias, florestas e noites?

_ Entreaberta, entre abraços, entre pernas, olhares.....

_ Acredita se eu disser que já te amo?

_ Belezapura, eu acredito... que eu te amo.

noite

Já estava com saudade da noite

quando ela voltou a invadir meu sono

só para me roubar os dias


de janelas abertas, ela lentamente infiltrar-se no meu quarto

e me sacode da cama para passear errante

e inventar palavras.

Para haver tronco, galho e flores

tem que haver raiz.

Minha raiz preta

me inventa no sonho do mundo

a sombra do sol, minha amante fiel

pulsa seu coração negro e traz as almas

vermelhas dos amigos,

seres fantásticos, colchas de retalhos

de poesias, músicas e lucianas e renatos,

tudo que ela revela no negrume da vida

é a ela que desejo nos dias.

Quando eu não existir mais, me busque nas trevas

que a noite sentirá.

Minha amiga já me vê ao longe e cobrindo o crepúsculo, me abraça,

me envolve no seu ventre obscuro

e com uma canção de ninar, menina noite.

Porque a palavra Adeus começa a raiar,

eu vejo a noite chorar

Plof!

Posso sentir a noite atrás de mim

Eu adorava vocês
Quando estavam vivos

A beleza fere o coração
Estaéavida


o sol nunca mais vai se pôr
eu não acredito mais na
morte,
quando vejo você,
não acredito:

Deus não seria tão burro
Ao ponto de destruir algo
Tão belo.
Você tem todas as belezas,

quero te levar pelo mundo
para que complete a perfeição
de cada paisagem

Quem não tem medo da vida?
como sua vida...
exalo-te perfume pelos poros

vá tua noite
fechei os olhos e te ouvi sorrindo

Tenho uma confissão a fazer,
estou tão envergonhado,
quando era criança, gostava de
joaninhas,
tanto que lhes arrancava as asas asasasasasas...
também caçava perdidamente borboletas
e as guardava em gaiolas de passarinhos;
Todas as noites sonhava em voar,

Deus me ama assim. Arrancando-me as asas

Eu te amo feito um balão,
um zepelim prateado
prestes a explodir em chamas

Arranca de mim a noite
Estou morrendo aqui – todo só
tão sem asas
numa gaiolinha de borboletas mortas

Bondade, amiguinha, seja boazinha, dê cafuné, colo, café, cuida de minha corda bamba.
Ploft!

Minha alma sempre pergunta pela sua

oi,
para começar, te amo.

na babilônia, te encontrei
passarinho
cantando minhas noites,
feito uma oração...

tantas vezes saímos voando por uma janela branca,
sobrevoamos cidades, dançamos em vênus,
nos alimentamos de universos,
a sobremesa estelar, nos fazia cosquinhas no céu da boca,
nos fazia sorrir por todos os motivos.

sinto saudade de nossos belos diálogos,
de brincar de telepatia, de implicar,
de cinema, de bar,
de icaraí, de sendas do ingá,
de cozinhar com as mãos.

minha amiga iluminante,
minha santidade,
quero cuidar da sua felicidade de novo,
todos os dias consolar sua imaginação,
domesticar os monstros que você criou,
quero deitar do seu lado calado,
ouvir seus sonhos de amor, de caridade, de terra molhada,
vamos nos cansar de rir

e fazer um silencinho,
pois minha alma sempre me pergunta pela sua,
vamos deixá-las conversar...